terça-feira, 27 de outubro de 2009

I'll find a way

Era terça pra quarta, madrugada. Eu passei muito tempo bloqueando a morte do meu pai, muito tempo me privando de sentir qualquer coisa a respeito. Eu lembro que no dia após a morte dele eu fiz um pedido, e de certa forma infeliz pra quem ouve a história, o desejo tomou forma e se concretizou. Em palavras perfeitas, eu diria que o meu pedido se tornou como um escudo e não me permitiu sentir nada sobre a minha perda, era como se eu caminhasse sobre vidro, sem saber que estava sobre ele. Então nós tomamos as providências sobre o legado, firmamos compromisso sobre a causa que ele lutava, até então tão fosca à minha visão. Eu aprendi a me virar sem a ajuda dele, aprendi a fazer todas as coisas que ele fazia, pra que eu pudesse carregar o que ele carregava, e creio ter feito bem. Graças a Deus.

No dia anterior a nossa despedida, na qual eu me lembro de que deitado na cama falei algumas palavras sonolentas com ele e ouvi o estalo da porta se fechando, jantamos cachorro quente. Ele estava cansado e fez algo que não costumava, me deu metade do dele, disse não estar com fome. Pediu que eu locasse um filme mais cedo e eu o fiz. Nós nos sentamos na sala ainda comendo e ele assistiu a alguns trailers que passaram. Em um deles notamos uma boa indicação, e meu pai no mesmo estado de espírito que eu me pediu que na próxima locação eu pegasse aquele. Concordei, mas não tinha em mente que aquela era a última vez que ele me indicava um filme. A ultima vez.
Fui sempre eu quem dei indicações, ele gostava dos filmes que eu passava pra ele, e essa era a regra. Eu me dei conta de que ele me deixou algo pra fazer, uma pendência, mas quando você bloqueia sentimentos por alguém que morreu, não pensa em acabar com os assuntos inacabados. E eu não queria assistir este filme. Eu encarei ele por alguns meses na locadora, depois que trabalhei numa indiquei pra muita gente sem nem mesmo assistir. Todos agradeceram e eu me perguntava porquê. Eu saí da locadora e depois de quarenta tentativas, peguei ele. Isso não foi o bastante, precisei relocá-lo mais cinco. E naquela madrugada de quarta feira eu o assisti.

Eu sentei no sofá e o dvd trancou, eu desisti. Loquei mais uma vez e por algum motivo fui até o fim. Eu não sei porque, mas o filme era parte da minha vida. Recordo de uma parte em que o protagonista senta em uma cadeira, e conta que tentava bloquear as memórias que tinha da esposa e das filhas falecidas porque o machucava todos os dias. Então ele continuava reformando a cozinha porque a esposa havia pedido. Ele se sentia perdido sem a família, e eu me senti perdido muito tempo sem saber o que fazer e pra onde ir. No fim do filme não sei por qual motivo ou razão, quando outro personagem tomou o patinete foi embora, antes dele virar a esquina, antes dele pensar em fazê-lo, me fugiu dos lábios um "Tchau Pai". Não sei porque, deve ser minha maneira de dizer adeus. Continuar os pedidos, os trabalhos, o que ele fazia. Achei importante dividir isto com o blog. Foi um último adeus pra alguém de quem eu nunca me despedi.

Festa country esse final de semana, não esqueçam.

Nenhum comentário: